quarta-feira, 17 de novembro de 2010

Pró-escolha e os Direitos Reprodutivos


Aborto: s.m. Expulsão espontânea ou provocada do produto da concepção antes do momento em que ele se torna viável. Assim diz o dicionário e quando espontânea, ocorre de maneira acidental ou natural. Já provocada pode ser considerado um ato brutal, criminal e pecador.
Há controvérsias a respeito deste assunto, sobretudo médica e científica. De acordo com o estudo Magnitude do Aborto no Brasil, da Organização Não-Governamental Ipas Brasil, a cada três crianças nascidas vivas no país, existe um aborto induzido. Por que há tantas mulheres optando pela morte pré-concebida do feto? Este procedimento, embora visto ainda de forma distorcida e repugnante pela maior parte da sociedade, é discutido por um movimento defensor do direito pela preferência de seguir ou não com a maternidade, chamado de “pró-escolha”.
O “pró-escolha” defende o direito de reprodução, incluindo o acesso à interrupção voluntária da gravidez de forma segura e legal. A atual concepção dos direitos reprodutivos não se limita à simples proteção da reprodução. De acordo com o livro “Direitos Reprodutivos no Brasil”, do Fundo de População das Nações Unidas – UNFPA, ela vai além, defendendo um conjunto de direitos individuais e sociais que interagem em busca do pleno exercício da sexualidade e reprodução humana. Essa nova concepção parte de uma perspectiva de igualdade e uma ampliação das obrigações do Estado para implementação desses direitos.
Literalmente falando, pro-choice (termo utilizado em países ingleses) ou pró-escolha defende o direito da mulher de ter filhos ou não, podendo cometer o ato de abortar. Desta forma, o movimento acredita que a mulher terá um vida melhor se puder interromper sua gestação, não sendo forçada a seguir adiante uma gravidez indesejada. Além disso, a interrupção voluntária poderá combater a criminalização de cessar o ato gestacional, pois a ilegalidade do aborto leva à procura por abortos ilegais, usualmente em condições inseguras.
Embora o aborto seja um assunto discutido, sobretudo por religiosos, por considerar tal ato um crime (o chamado pró-vida), os direitos reprodutivos sustentam a ideologia de redução às violações à autonomia pessoal, integridade física e psicológica de que são alvos indivíduos e coletividades, e garantir os meios necessários para o ser humano alcançar seu bem-estar sexual e reprodutivo. Ou seja, o ato de abortar é um assunto que cabe à mulher decidir, sem que o Estado interfira. 
Todavia, onde há gravidez indesejada pode haver também irresponsabilidades pessoais. Diferentes métodos contraceptivos como métodos de barreira, hormonais, DIU, sintotérmico e de esterilização estão disponíveis à população em qualquer lugar do mundo, muitos deles gratuitos. Cabe a mulher procurar orientação médica se houver dúvida para prevenção de gravidez e prevenir-se quando necessário. Surge então, neste ponto, a controvérsia sobre a liberdade gestacional a que discuto. Se uma mulher engravida acidentalmente por falta do uso de contraceptivos, qual a justificativa ética e moral para abortar? Deve se levar em consideração um ato sexual desejado por ambas as partes.
É sustentado por esta pergunta que o cristianismo condena a questão sobre a qual a mulher tem o direito de abortar. Na bíblia diz que Deus nos conhece antes de nos formar no útero (Jeremias 1:5), dá a mesma pena a alguém que comete um homicídio e para quem causa a morte de um bebê no útero (Êxodo 21:22-25). De acordo com os cristãos, isto indica claramente que Deus considera um bebê no útero como um ser humano, ainda que feto.
Entretanto, notifiquemos os inúmeros casos subumanos de estupro em que, mesmo a pessoa amparada por lei e haver reclusão para o criminoso, o ato leva o “ser lesado” a um constrangimento capaz de deixar sequelas por toda vida. Daí um dos motivos pelo qual o “pró-escolha” resguarda em sua ideologia defensora dos direitos reprodutivos. Também reconhecer um momento preciso como este para a prática do aborto é passar por cima de diferenças individuais, de religiosidade e de moralismo.
A história do Brasil foi marcada por uma cultura religiosa cristã-católica que transpôs para o discurso da reprodução humana o plano obediência e servidão da mulher em relação ao homem e a procriação de tantos filhos quantos Deus e a natureza determinassem. Portanto, neste país se tiver que traçar uma linha, então que seja conservadora. Há quem resista a isso e, portanto, torna o aborto um ato criminal. Mas se querem que estabeleça um compromisso prático entre as duas posições absolutas, tem que especificar pelo menos um tempo de transição para a pessoalidade, um limite, sem transgredir as leis do homem tampouco as leis de Deus. 

Um comentário:

Guilherme disse...

Ótimo texto. Parabéns.